Pular para o conteúdo principal

Ram Charan: O guru dos presidentes

Um almoço no dia 20 de junho, no salão do clube mais tradicional de Joinville, o Sociedade Harmonia Lyra, reuniu 270 empresários e altos executivos brasileiros, como Décio Silva, acionista e presidente do conselho de administração da Weg, e Ernesto Heinzelmann, presidente da Embraco. Todos estavam lá para conhecer o consultor que costuma falar ao pé do ouvido de alguns dos executivos mais poderosos do mundo: o indiano Ram Charan. O evento em Joinville foi apenas um dos compromissos da agenda do guru no país. Nas menos de 48 horas que passou no Brasil, Charan falou para mais de 2 500 pessoas em quatro eventos diferentes, em Joinville e em Curitiba, no Paraná. Ir de um lado a outro do mundo, sem se preocupar com casa, família ou emprego, é a rotina de Charan. Aos 68 anos, ele é hoje um dos mais populares — e ativos — gurus de negócios. Faz 60 palestras por ano, numa média de mais de uma por semana, em cidades tão diferentes e distantes como Joinville e Dubai, nos Emirados Árabes. Em meio ao assédio de executivos e intermináveis viagens de avião, Charan lança pelo menos um livro por ano e atua como conselheiro direto de executivos como A.G. Lafley, presidente mundial da Procter&Gamble, e Jeff Immelt, da GE. “Essa rotina para mim é como estar de férias”, disse Charan (que, aliás, não tira férias) em entrevista exclusiva a EXAME.

Charan percorreu um caminho incomum entre os gurus formados no ambiente acadêmico — uma confraria da qual fazem parte nomes como Gary Hamel, professor da London Business School, e Michael Porter, professor da escola de negócios de Harvard. Primeiro indiano a dar aulas em Harvard, Charan abandonou o ensino na universidade há três décadas. Seus cursos hoje só acontecem sob encomenda de empresas — e são disputados como poucos. Charan foi apontado recentemente pela revista americana Business Week como um dos dez melhores consultores do mundo para cursos in company, um dos mercados mais lucrativos para os especialistas de negócios. Há 35 anos, ele é uma das estrelas em Crotonville, o lendário centro de treinamento de executivos da GE. Tamanha exposição inflacionou sua remuneração. Há apenas três anos, Charan cobrou 20 000 dólares para fazer uma exposição em São Paulo. Hoje, não aceita dar uma palestra de 1 hora por menos de 100 000 dólares. Todas as apresentações são inspiradas nos temas de seus livros. O mais popular deles é o best-seller Execução: A Disciplina para Atingir Resultados. O livro esteve por 50 semanas na lista dos mais vendidos do jornal The New York Times logo após seu lançamento, em 2002.

Tanto nos livros como nas palestras, Charan se comunica com uma linguagem simples, distante da habitual sisudez do discurso acadêmico. Em todas as suas apresentações no Brasil, ele quebrou o gelo inicial com a platéia ao perguntar, sorrindo: “O que vocês acham do meu sotaque indiano?” O passo seguinte era tirar o paletó azul-escuro e a gravata e começar a circular entre a platéia. Avesso a recursos do tipo PowerPoint, ele se limitou a projetar num telão apenas algumas linhas escritas à mão e quase ilegíveis. O jeitão coloquial pode ser observado em algumas de suas lições — algumas delas tão simplistas que quase parecem óbvias. Entre seus mantras estão: “Ninguém pode ter 20 prioridades. No máximo cinco” e “Ninguém é incompetente, só está no lugar errado. O trabalho do líder é saber qual é o lugar certo de cada um”. A característica parece ser um dos segredos de sua popularidade. “Ram tem a rara habilidade de distinguir o que é relevante daquilo que não tem importância”, afirmou recentemente à revista americana Fortune Jack Welch, ex-presidente da GE e um dos amigos mais próximos de Charan.

O guru gosta de dizer que aprendeu os princípios de negócios na mercearia de seu pai, na Índia. A linguagem dos negócios, segundo ele, é a mesma, seja para um feirante, seja para o presidente de uma grande companhia. “No fundo, todos são avaliados pelas mesmas coisas”, afirma ele. Nos anos 60, Charan mudou-se para os Estados Unidos para cursar MBA na Harvard Business School. Ali fez também seu doutorado. A notoriedade pública só chegaria com seus primeiros livros. Charan começou a publicá-los em 1998 e não parou mais. Desde então, lançou um título por ano e já vendeu mais de 2 milhões de exemplares. “Hoje, ele é um dos três autores da editora que mais vendem”, diz Henrique Farinha, diretor da unidade de negócios da Campus-Elsevier, que publicou todos os 11 títulos do autor no Brasil.


O que ele diz
Algumas das máximas do consultor:

"Minha experiência me convenceu de que, sem dúvida, os mesmos princípios permeiam todos os negócios — dos vendedores de rua às grandes empresas. A linguagem de um vendedor de rua é a mesma de um profissional como Jack Welch ou Michael Del"

"Inovar significa compreender uma nova necessidade do consumidor e reverter isso em vendas. Inovação sem o consumidor é inútil"

"Um líder não existe se não conseguir desenvolver as melhores pessoas sob seu comando"


Na vida particular, Charan é ainda mais peculiar. É um homem solitário (não tem mulher nem filhos) e passa boa parte de seu tempo entre aviões e quartos de hotéis, já que não tem sua própria casa. Sempre que chega ao hotel Waldorf, em Nova York, o porteiro lhe diz: “Bem-vindo a sua casa, professor Charan”. Sua companheira mais constante é uma pequena mala preta que leva nas viagens. As roupas sujas são enviadas toda semana a um escritório alugado em Dallas, nos Estados Unidos, onde a secretária as troca por peças limpas. Ele raramente aparece por lá, mas é o endereço do escritório que consta em seu passaporte americano. O ex-presidente mundial do Citicorp John Reed costuma convidá-lo para passar o Natal em sua casa, já que o amigo não tem onde passar as festas de final de ano. Perguntado por EXAME sobre os detalhes quase folclóricos de sua vida pessoal, ele se limitou a afirmar que não fala sobre o assunto: “Meu negócio é expor e discutir idéias com as pessoas”. Para levar adiante essa missão, ele não investe apenas tempo. Ao final de sua programação em Joinville, foi avisado que teria uma reunião no dia seguinte em Washington — compromisso que não fazia parte da agenda. Charan decidiu alugar um jatinho, com dinheiro do próprio bolso, para voar antecipadamente de Santa Catarina para São Paulo e assim garantir que chegaria à capital americana a tempo. “Minha vida é resolver os problemas das empresas, e não meço esforços para isso”, diz.


Fonte: Por Suzana Naiditch, in portalexame.abril.com.br

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

H2OH! - um produto desacreditado que virou sucesso

O executivo carioca Carlos Ricardo, diretor de marketing da divisão Elma Chips da Pepsico, a gigante americana do setor de alimentos e bebidas, é hoje visto como uma estrela em ascensão no mundo do marketing. Ele é o principal responsável pela criação e pelo lançamento de um produto que movimentou, de forma surpreendente, o mercado de bebidas em 11 países. A princípio, pouca gente fora da Pepsi e da Ambev, empresas responsáveis por sua produção, colocava fé na H2OH!, bebida que fica a meio caminho entre a água com sabor e o refrigerante diet. Mas em apenas um ano a H2OH! conquistou 25% do mercado brasileiro de bebidas sem açúcar, deixando para trás marcas tradicionais, como Coca-Cola Light e Guaraná Antarctica Diet. Além dos números de vendas, a H2OH! praticamente deu origem a uma nova categoria de produto, na qual tem concorrentes como a Aquarius Fresh, da Coca-Cola, e que já é maior do que segmentos consagrados, como os de leites com sabores, bebidas à base de soja, chás gelados e su

Doze passos para deixar de ser o “bode expiatório” na sua empresa

Você já viu alguma vez um colega de trabalho ser culpado, exposto ou demitido por erros que não foi ele que cometeu, e sim seu chefe ou outro colega? Quais foram os efeitos neste indivíduo e nos seus colegas? Como isso foi absorvido por eles? No meu trabalho como coach, tenho encontrado mais e mais casos de “bodes expiatórios corporativos”, que a Scapegoat Society, uma ONG britânica cujo objetivo é aumentar a consciência sobre esta questão no ambiente de trabalho, define como uma rotina social hostil ou calúnia psicológica, através da qual as pessoas passam a culpa ou responsabilidade adiante, para um alvo ou grupo. Os efeitos são extremamente danosos, com conseqüências de longo-prazo para a vítima. Recentemente, dei orientação executiva a um gerente sênior que nunca mais se recuperou por ter sido um dia bode expiatório. John, 39 anos, trabalhou para uma empresa quando tinha algo em torno de 20 anos de idade e tudo ia bem até que ele foi usado como bode expiatório por um novo chefe. De

Conselho Federal de Marketing?

A falta de regulamentação da profissão de marketing está gerando um verdadeiro furdunço na Bahia. O consultor de marketing André Saback diz estar sendo perseguido por membros do Conselho Regional de Administração da Bahia (CRA/BA) por liderar uma associação – com nome de Conselho Federal de Marketing e que ainda não está registrada – cujo objetivo, segundo ele, é regulamentar a profissão. O CRA responde dizendo que Saback está praticando estelionato e que as medidas tomadas visam a defender os profissionais de administração. Enquanto André Saback, formado em marketing pela FIB - Centro Universitário da Bahia -, diz militar pela regulamentação da profissão, o Presidente do CRA/BA, Roberto Ibrahim Uehbe, afirma que o profissional criou uma associação clandestina, está emitindo carteirinhas, cobrando taxas e que foi cobrado pelo Conselho Federal de Administração por medidas que passam até por processar Saback, que diz ter recebido dois telefonemas anônimos na última semana em tom de ameaç