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Empresas fecham os olhos para a pirataria

Tempos atrás, o DJ e estilista japonês Nigo teve um estalo que lhe rendeu muito dinheiro. Resolveu criar a própria versão do tênis de basquete Air Force 1, um dos maiores sucessos da história da Nike, para vender aos admiradores de hip-hop. Usou o mesmo design e relançou o tênis em cores mais vibrantes. Uma estrela substituiu o conhecido logotipo da fabricante americana. Foi um sucesso. Um caso claro de pirataria a ser levado à Justiça, certo? Não para a Nike. A empresa avaliou que a iniciativa de Nigo ajudava a popularizar o seu produto num mercado em que não atuava. Em vez de ir aos tribunais, decidiu criar versões mais modernas do tênis que havia lançado em 1982. Hoje o veterano Air Force 1 continua a vender bem e a sua versão pirata é uma das atrações das 16 lojas da Bathing Ape, a rede criada por Nigo em cidades japonesas, em Londres e em Nova York.

Assim como a Nike, outras empresas começam a perceber que, muitas vezes, a pirataria é um assunto a ser resolvido pela área de marketing, não pelo departamento jurídico.

Em alguns casos, a tolerância com os piratas pode trazer mais benefícios do que danos, afirma o jornalista americano Matt Mason em seu recém-lançado The Pirate's Dilemma ("O dilema do pirata"). "Os piratas podem dar mais visibilidade para as marcas, e grandes corporações começaram a reconhecer o valor dessas ações", diz. Segundo o livro, a pirataria está se espalhando e transformando a economia global. Um dos casos mais notórios é o da indústria fonográfica, que foi obrigada a aceitar os novos tempos e desistiu de processar os consumidores que trocavam músicas pela internet.

A pirataria ajudou a criar o cinema americano e tornou o rock mais popular na Europa
De acordo com Mason, a briga contra os que roubam conteúdos muitas vezes tem conseqüências indesejadas. É preciso avaliar com frieza cada caso. Entre outros malefícios, pode provocar a revolta dos mesmos consumidores que se pretende atingir. É o que aconteceu com o jogo de tabuleiro Scrabble, um tipo eletrizante de palavras cruzadas que é disputado entre duas e quatro pessoas. A Hasbro, que o comercializa nos Estados Unidos e no Canadá, e a Mattel, que o vende no restante do planeta, anunciaram em janeiro que iriam processar os criadores da versão online veiculada no site de relacionamento Facebook. A decisão provocou a revolta dos que se divertem com o jogo pirata - são mais de 700 mil fanáticos a cada dia. Foram criadas comunidades no Facebook - como a "Salvem o Scrabulous" (nome do jogo pirata) - contrárias à ação dos fabricantes americanos. Simpatizantes fizeram um abaixo-assinado no qual prometem boicotar as empresas se o processo tiver sucesso. Um usuário anunciou que fará uma greve de fome se o jogo sair do ar. Um clip foi colocado no YouTube contra a Hasbro e a Mattel. Depois da reação, as duas fabricantes passaram a levar a pendenga em banho-maria e o caso ainda não teve um desfecho - mesmo o processo contra os criadores do Scrabulous não foi confirmado pelas empresas.

O livro de Mason mostra que a pirataria, por mais nefasta que seja em alguns casos, ajudou a criar o ambiente cultural em que vivemos. Lembra que, ao inventar o fonógrafo, Thomas Edison passou a ser chamado de "pirata" pelos músicos, que temiam o fim das casas em que se apresentavam. Uma acusação que só perdeu força quando foi criado o sistema de pagamentos de royalties, que prevalece até os dias de hoje. Anos depois, o mesmo Thomas Edison inventou um aparelho precursor da filmadora e exigiu o pagamento de uma licença para os que pretendiam usar sua tecnologia. Uma turma de cineastas piratas resolveu então deixar Nova York para filmar com mais sossego, sem fiscalização, na selvagem Califórnia, onde puderam prosperar sem precisar pagar nada ao inventor do equipamento. Entre eles estava William Fox, criador do célebre estúdio americano. Mais tarde, já na legalidade, esse grupo de piratas fundou Hollywood.

E, afirma Mason, foram as rádios piratas que popularizaram o rock no Reino Unido e em outros países europeus, numa época em que as emissoras oficiais costumavam transmitir apenas notícias e programas educacionais. Antenas instaladas em barcos antigos fizeram com que os jovens pudessem acompanhar a música produzida no outro lado do Atlântico. Uma artimanha só encerrada quando as rádios comerciais foram legalizadas.


Fonte: epocanegocios.globo.com

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