Pular para o conteúdo principal

O exterminador que abraça árvores

Quando foi eleito para o primeiro mandato de governador da Califórnia, em 2003, Arnold Schwarzenegger, 12 vezes campeão de torneios mundiais de fisiculturismo e protagonista de filmes como Conan, o Bárbaro e O Exterminador do Futuro, era apenas mais um astro de Hollywood que se aventurava na política americana. Na época, muita gente achou que aquilo não passava de piada e que ele faria uma gestão tão estabanada quanto o policial que cuida de crianças em um de seus filmes. No final de 2007, Schwarzenegger conseguiu chegar a seu segundo mandato. Eleito com 56% dos votos, ele já não era mais conhecido como o bufão recém-chegado ao cenário político, mas como um dos mais importantes líderes contra o aquecimento global. Parte dessa importância deve-se à pujança do estado que Schwarzenegger comanda -- a Califórnia concentra 12% da população americana e tem um PIB de 1,3 trilhão de dólares por ano. (Se fosse um país, seria a oitava maior economia do mundo.) A outra razão é que Schwarzenegger -- o "governator", como é hoje conhecido -- tem um estilo um tanto briguento, como a maioria dos personagens que interpretou no cinema. Hoje, seus rivais mais recorrentes na luta contra o aquecimento global são a indústria automobilística americana e o governo federal de George W. Bush, um republicano como ele próprio. "Estamos fazendo nossa parte, e o governo federal, não", disse Schwarzenegger em tom desafiador numa campanha de TV de 30 segundos veiculada em rede nacional no final do ano passado. "Agora é a vez deles."

A jornada verde do ex-exterminador do futuro já registrou algumas conquistas, como uma legislação para impor limites à emissão de gases de efeito estufa e os primeiros resultados de um programa de mudança da matriz energética do estado da Califórnia. "O governador Schwarzenegger assumiu a liderança entre os estados americanos na luta pela redução das emissões de carbono. E está no caminho certo", afirmou a EXAME Tom Smith, diretor do instituto para o meio ambiente da Universidade da Califórnia e um dos mais respeitados especialistas no assunto do país.


As metas do “governator”
Os principais objetivos estabelecidos por Schwarzenegger para que a Califórnia ajude a combater o aquecimento global:

- Nos próximos 12 anos, as indústrias instaladas na região devem diminuir a emissão de gases de efeito estufa em 25%
- Até 2016, a emissão de gás carbônico pelos carros produzidos no estado deve ser reduzida(1)30%
- 20% da eletricidade consumida no estado deverá vir de energias renováveis até 2010. Para 2020, o objetivo é que esse percentual chegue a 33%

(1) Amedida ainda não entrou em vigor por causa de uma barreira na esfera federal


O PRIMEIRO -- E MAIS POLEMICO -- EMBATE de Schwarzenegger foi pela legislação para reduzir a emissão de gases de efeito estufa. Logo em 2004, ele apoiou a agência ambiental californiana na iniciativa de tirar do papel uma lei aprovada dois anos antes que obriga os fabricantes de automóveis a desenvolver carros que emitam 30% menos gás carbônico até 2016. As montadoras foram à Justiça contestar, com o argumento de que essas normas só podem ser impostas pela esfera federal. Juntamente com outros 12 estados, a Califórnia levou o caso à Corte Suprema dos Estados Unidos. Num dos rounds mais recentes, no final do ano passado, a poderosa agência de proteção ambiental americana (EPA, na sigla em inglês) negou autorização para que a Califórnia regulasse normas próprias para as emissões de automóveis. Em 2006, o governator -- uma corruptela das palavras governor e Terminator (título em inglês de O Exterminador do Futuro) -- foi mais longe e costurou um acordo com os democratas, que controlam o Legislativo estadual, para aprovar uma lei que obriga todas as indústrias do estado a diminuir em 25% a emissão de gases de efeito estufa até 2020. Os representantes republicanos defendem que a estratégia para enfrentar o problema deve ser nacional, e não estado por estado.

Um dos maiores méritos do discurso do governator até agora tem sido o efeito multiplicador e a capacidade de levar o debate a todo o país. Outros governadores, como Jon Huntsman Jr., do estado de Utah, e Brian Schweitzer, de Montana, passaram a adotar metas semelhantes de redução das emissões de carbono (o mesmo aconteceu com os planos em relação à mudança da matriz energética desses estados). Por insistência de Schwarzenegger, a meta de a Califórnia obter 20% de sua eletricidade de energias renováveis em 2017 foi antecipada para 2010. Para 2020, o objetivo é atingir 33% de participação de fontes renováveis, como biomassa, pequenas hidrelétricas e energias solar e eólica. As estimativas apontam que, até lá, a indústria de energias renováveis movimentará 60 bilhões de dólares por ano na Califórnia. O esforço começa a se disseminar por outros 20 estados americanos, que criaram leis com metas de ampliação da fatia de renováveis na matriz elétrica. Além de outros governadores, o discurso de Schwarzenegger conquistou o apoio de acadêmicos e ambientalistas. "A forte liderança de Schwarzenegger contrasta com as ações mínimas do governo federal diante da crise climática", diz Michael Tottlen, da ONG Conservação Internacional, com sede em Washington. Segundo Tottlen, as iniciativas de Schwarzenegger revitalizaram a musculatura da agenda ambiental da Califórnia, que desde os anos 70 é uma das pioneiras em medidas governamentais para a redução do consumo de energia.

O programa mais alardeado por Schwarzenegger até agora é o que pretende instalar 1 milhão de placas de energia solar em casas californianas nos próximos dez anos. Para isso, o governo administra um fundo de 350 milhões de dólares, capaz de cobrir um terço do custo de instalação de cada painel, tornando o equipamento mais barato para o cidadão comum. Se o plano for seguido à risca, em 2017 a Califórnia contará com 3 000 megawatts de eletricidade produzida com energia solar (quase o equivalente à capacidade de geração da usina de Ilha Solteira, no interior de São Paulo, a terceira maior hidrelétrica do Brasil). Tamanho incentivo às energias renováveis vem atraindo investidores de capital de risco. Fundos de investimento injetaram quase 1 bilhão de dólares em empresas localizadas na região que desenvolvem tecnologias limpas. A lógica de perseguir uma diversidade de fontes energéticas é evitar crises como as que ocorreram em 2000 e 2001 e levaram a um humilhante apagão estadual.

A agenda ambiental de Schwarzenegger também ganhou recentemente um caráter pessoal, quando ele adaptou sua frota particular -- dois enormes e beberrões jipes da marca Hummer -- para que emita menos poluentes. Um dos carros foi convertido ao hidrogênio e outro ao biocombustível. Com dupla nacionalidade (austríaco de nascimento, ele conseguiu a cidadania americana em 1983) e casado com uma integrante do clã Kennedy, Maria Shriver, Schwarzenegger conquistou o posto de governador num momento em que a Califórnia passava por uma crise. Em 2003, uma petição assinada por mais de 1 milhão de californianos levou o estado a realizar um recall. Trata-se do mecanismo pelo qual os eleitores são chamados a se pronunciar a respeito da permanência ou não de determinado político em seu cargo -- no caso, o governador. O ocupante do posto na época era o democrata Gray Davis, que estava no primeiro ano de seu segundo mandato e atolado em problemas: déficit orçamentário de 38 bilhões de dólares, alto nível de desemprego e crise nas escolas. Na mesma votação, os eleitores tinham de escolher um substituto. O eleito foi Schwarzenegger, ativo militante do Partido Republicano, entre mais de 100 candidatos. Ele ainda não resolveu o déficit do estado -- embora a situação hoje seja bem melhor do que no passado. Em janeiro, declarou estado de emergência das contas públicas, com um déficit de 3,3 bilhões de dólares, em parte como desdobramento do estouro da bolha imobiliária. "Não sou um ambientalista fanático", diz Schwarzenegger. "Não vejo esse cenário em que vivemos como o fim do mundo, e sim como a oportunidade de limpar a bagunça que fizemos."


Fonte: Por Iracy Paulina, in portalexame.abril.com.br

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

H2OH! - um produto desacreditado que virou sucesso

O executivo carioca Carlos Ricardo, diretor de marketing da divisão Elma Chips da Pepsico, a gigante americana do setor de alimentos e bebidas, é hoje visto como uma estrela em ascensão no mundo do marketing. Ele é o principal responsável pela criação e pelo lançamento de um produto que movimentou, de forma surpreendente, o mercado de bebidas em 11 países. A princípio, pouca gente fora da Pepsi e da Ambev, empresas responsáveis por sua produção, colocava fé na H2OH!, bebida que fica a meio caminho entre a água com sabor e o refrigerante diet. Mas em apenas um ano a H2OH! conquistou 25% do mercado brasileiro de bebidas sem açúcar, deixando para trás marcas tradicionais, como Coca-Cola Light e Guaraná Antarctica Diet. Além dos números de vendas, a H2OH! praticamente deu origem a uma nova categoria de produto, na qual tem concorrentes como a Aquarius Fresh, da Coca-Cola, e que já é maior do que segmentos consagrados, como os de leites com sabores, bebidas à base de soja, chás gelados e su

Doze passos para deixar de ser o “bode expiatório” na sua empresa

Você já viu alguma vez um colega de trabalho ser culpado, exposto ou demitido por erros que não foi ele que cometeu, e sim seu chefe ou outro colega? Quais foram os efeitos neste indivíduo e nos seus colegas? Como isso foi absorvido por eles? No meu trabalho como coach, tenho encontrado mais e mais casos de “bodes expiatórios corporativos”, que a Scapegoat Society, uma ONG britânica cujo objetivo é aumentar a consciência sobre esta questão no ambiente de trabalho, define como uma rotina social hostil ou calúnia psicológica, através da qual as pessoas passam a culpa ou responsabilidade adiante, para um alvo ou grupo. Os efeitos são extremamente danosos, com conseqüências de longo-prazo para a vítima. Recentemente, dei orientação executiva a um gerente sênior que nunca mais se recuperou por ter sido um dia bode expiatório. John, 39 anos, trabalhou para uma empresa quando tinha algo em torno de 20 anos de idade e tudo ia bem até que ele foi usado como bode expiatório por um novo chefe. De

Conselho Federal de Marketing?

A falta de regulamentação da profissão de marketing está gerando um verdadeiro furdunço na Bahia. O consultor de marketing André Saback diz estar sendo perseguido por membros do Conselho Regional de Administração da Bahia (CRA/BA) por liderar uma associação – com nome de Conselho Federal de Marketing e que ainda não está registrada – cujo objetivo, segundo ele, é regulamentar a profissão. O CRA responde dizendo que Saback está praticando estelionato e que as medidas tomadas visam a defender os profissionais de administração. Enquanto André Saback, formado em marketing pela FIB - Centro Universitário da Bahia -, diz militar pela regulamentação da profissão, o Presidente do CRA/BA, Roberto Ibrahim Uehbe, afirma que o profissional criou uma associação clandestina, está emitindo carteirinhas, cobrando taxas e que foi cobrado pelo Conselho Federal de Administração por medidas que passam até por processar Saback, que diz ter recebido dois telefonemas anônimos na última semana em tom de ameaç